O papel social das empresas e a responsabilidade do poder público na proteção da vítima de violência doméstica

Publicado por: Miken
23/08/2021 14:49:48
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Courtesy Pexels
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Mayra Vieira Dias*

“Sofri violência doméstica e ainda fui demitida, estou completamente desamparada, meus filhos não têm o que comer e eu vou ter que me mudar porque não vou conseguir pagar o aluguel”.

 

Esta é a vida não de uma, mas de várias mulheres que foram vítimas de violência doméstica no Brasil. Além de estarem extremamente debilitadas psicológica e muitas vezes fisicamente, ainda experimentam o dissabor do desemprego e a falta de mínimas condições de alimentação e moradia para si e para seus filhos.

 

A Lei 11.340/2006 protege a mulher de mais um desgaste após tanto sofrimento. O artigo 9º da Lei Maria da Penha prevê que a assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso.

 

Ainda, o parágrafo 2º do mesmo artigo prevê que o Juiz determinará a manutenção do vínculo trabalhista e assim, quando necessário, o afastamento do local de trabalho por até seis meses.

 

Entretanto, infelizmente, a maioria das empresas desconhecem essas regras e tomam decisões tão somente baseadas nas questões financeiras - custo x benefício, esquecendo do papel social que deveria ser intrínseco nos valores de qualquer empresa.

 

Numa época em que a Organização das Nações Unidas (ONU) discute cota de 30% dos cargos de lideranças para mulheres - O Pacto Global, movimento Equidade é Prioridade, e em que há Projeto de Lei em votação estabelecendo cota de 5% para mulheres vítimas de violência - PL 5548/2019 , não pensar em minimizar a dor de uma mulher nesta situação é perder qualquer senso de humanidade, uma vez que a garantia de emprego à mulher vítima de violência, prevista na Lei Maria da Penha, contempla maior garantia constitucional, bem como vai de encontro à Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.

 

Não obstante, nos deparamos com um problema gigantesco neste contexto: quem arca com as despesas desse afastamento? Não há, por enquanto, Lei que responsabilize a Seguridade Social a fornecer auxílio às vítimas de violência em situação de vulnerabilidade. O Projeto de Lei 3.256/2012, que trata desse tema, está sem andamento desde 2017, aguardando designação de relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), mesmo tendo parecer favorável pela relatoria anterior.

 

Ademais, seria injustiça imensa colocar tal despesa na conta da empresa que não teve qualquer relação com a violência sofrida pela mulher.

 

Ou seja, a mulher sai do ciclo de violência, mas não consegue sair da condição de vulnerabilidade, muitas vezes restando a ela voltar para o agressor, único que, muitas vezes, apesar de tudo, lhe concede abrigo e alimento, bem como aos seus filhos.

 

Instituir medida que assegure à mulher e seus filhos em situação de vulnerabilidade condições mínimas de subsistência é o mínimo a ser feito pelo Poder Público, pois, é direito personalíssimo da mulher vítima de violência doméstica e familiar gozar dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, estabelecidos na nossa Magna Carta, a Constituição Federal de 1988.

 

*Mayra Vieira Dias é advogada, sócia do escritório Calazans e Vieira Dias e ativista no combate à violência contra a mulher

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