Sai Cofrinho, entra Cofrinho Jr.

Publicado por: admin
21/10/2020 06:00:00
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Cortesia Pixabay
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Carlos Brickmann  - 21 de outubro de 2020

Chico Rodrigues, DEM, o senador cuja história entrou para os anais, tirou 121 dias de licença do Senado. Assim, a decisão do ministro Barroso – que nome predestinado! – de afastá-lo do cargo, por 90 dias, foi suspensa pelo próprio ministro, por ter-se tornado desnecessária. Mas o importante nem é isso: é que, licenciando-se por 121 dias, um senador automaticamente passa o cargo ao suplente. No caso, o suplente é Pedro Arthur Ferreira Rodrigues, também do DEM, e também filho de Chico Rodrigues e herdeiro, pelo menos temporário, de seu mandato. E passa a desfrutar das mordomias do cargo. Citando a frase clássica, a família é a base da sociedade. E ninguém, claro, criticará tão belo exemplo de solidariedade entre pai e filho.

 

A história, claro, não termina por aqui. Chico Rodrigues insiste em dizer que o dinheiro localizado no insólito esconderijo era destinado ao pagamento de seus empregados. Vá lá, vá lá – mas que é que pode ocorrer se suas empresas crescerem, graças a seu trabalho e seu tino gerencial, e contratarem mais funcionários? Chico Rodrigues, em vídeo que enviou aos senadores, também diz que, ao enfiar o dinheiro no providencial esconderijo sob suas cuecas, tomou “a decisão mais irracional de sua vida”. Engano: a decisão mais irracional de sua vida foi candidatar-se; e a dos eleitores, dar-lhe o voto. Mas aceitemos. Só que, quando alguém está prestes a ser preso, costuma mastigar e engolir as provas. Errar o lado do aparelho digestivo é novidade.

 

Quem topa a aposta?

Este colunista aposta que, daqui a 120 dias, não vai acontecer nada com o senador Chico Rodrigues. Daqui a 240 dias, ou 360, também não. Mas a aposta só vale se a Polícia Federal sair de cena. Lembrando a frase imortal de Mané Garrincha, falta combinar com os russos. Tirando a Federal, todos os demais envolvidos no caso, ou os que deveriam envolver-se, vão deixar claro que não é com eles. Por que os senadores vão se mexer, abrindo caminho para que o STF afaste outros que forem suspeitos de crime? E quem pode atirar a primeira pedra? Se a Federal mantiver as investigações, aí as coisas mudam: sai o senador Cofrinho, entra o senador Cofrinho Jr.

 

Todos bonzinhos

Em princípio, o pacote comercial acertado entre Brasil e Estados Unidos é uma ótima notícia: desburocratiza as trocas entre os dois países, reduz as restrições, abre caminho para, no futuro, um acordo de livre comércio. Mas é preciso ver se, na prática, o acordo não é apenas a contribuição brasileira para mostrar que a política externa do presidente Trump, a duas semanas das eleições americanas, funciona bem. Os exemplos anteriores não chegaram a ser brilhantes: o Brasil, que produz álcool de cana (mais barato que o álcool de milho americano), abriu o mercado para importar álcool dos EUA, sem tarifas, mas o açúcar brasileiro continua enfrentando barreiras. Bolsonaro deu todas as demonstrações de deferência para com Trump, recebeu promessa de apoio à entrada do Brasil na OCDE, Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico, mas até hoje continuamos fora. O filho 03 de Bolsonaro, aquele que queria ser embaixador em Washington, chegou a usar bonés eleitorais de Trump, mas os EUA, rompendo longa tradição, resolveram apresentar candidato à presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento, para isso afastando o candidato brasileiro. Em resumo, até agora houve muito toma-lá e pouco dá-cá.

 

A boa notícia

A única coisa efetivamente concreta que aconteceu na visita da delegação dos EUA ao Brasil foi a assinatura, pelo ministro Paulo Guedes e a presidente do Eximbank (banco de importação e exportação), Kimberly Reed, de um memorando sobre abertura de financiamento de produtos americanos, até um bilhão de dólares. É bom; mas no momento é melhor para os EUA do que para o Brasil. O Governo americano faz pressão forte e aberta para que o Brasil não permita a participação da chinesa Huawei na licitação da faixa de 5G de telecomunicações, prevista para o ano que vem. Como a Huawei já tem ampla participação nas telecomunicações do país, afastá-la pode fazer com que nossa Internet, já caríssima, fique ainda mais cara, com a troca de sistemas inteiros que hoje integram a rede. Os EUA já falaram em financiar a troca (e sem exigir que a Qualcomm americana seja beneficiada: aceitam também a finlandesa Nokia e a sueca Ericsson). Só não querem a Huawei.

 

...mas

O primeiro problema é que neste momento a Huawei é a líder mundial da tecnologia 5G, seguida por Nokia e Ericsson, e só então pela Qualcomm. O segundo problema é mais sério: a China é hoje o maior parceiro comercial do Brasil. Afastar da concorrência a sua representante pode gerar algum tipo de retaliação – até porque o que se levanta contra a Huawei é a possibilidade de que o Governo chinês utilize a rede para fazer espionagem. Boicotar a Huawei significa, em outras palavras, desconfiar do maior parceiro do país.

 

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